Este texto foi escrito ao longo
do sábado, dia 30, e concluído na manhã do domingo, 31.
Durante muitos anos eu andei em montanha russa. Sentia uma
sensação de pavor, mas continuava andando. Até que uma vez, em 1996, no Beto
Carrero, enquanto o carrinho da montanha russa subia eu pensei: “o que estou
fazendo aqui?”. Não tinha resposta racional para esta pergunta. Mas nunca mais
andei, já faz 19 anos.
Durante essas férias eu pensei várias vezes: “o que estou
fazendo aqui?”. Não digo que nunca mais viajarei de férias (a vontade é nunca
mais viajar), mas será necessário um longo intervalo para recuperação
psicológica e emocional.
Sem nenhuma razão
objetiva, eu nunca havia viajado de American Airlines. Esta foi a primeira vez.
E a última. Não fará nenhuma diferença para eles a minha decisão de não mais
usar seus serviços, pois todos os voos American que pegamos estavam
completamente lotados. O ser humano em geral se acomodou num nível tão grande
de mediocridade que não vê problema em ser mal tratado pela companhia aérea,
pelo pessoal do aeroporto, pela segurança, pelo plano de saúde, pela operadora
de telefonia, pelo governo.
Já descrevi aqui no blog como iniciaram nossas férias – sem
poder chegar ao destino por conta de não termos vacina contra a febre amarela.
Até aí não foi culpa da American. Mas não recebemos nenhum centavo de volta de
tudo que já havíamos pago nas Bahamas.
A atuação da American começou logo na sequência. Por não
termos conseguido fazer uma das pernas do trecho (Miami – Nassau), o que não
ocasionou nenhum prejuízo para eles, derrubaram nossas reservas. Para reemitir
cobraram cerca de R$8 mil. Era pagar ou ficar nos EUA, como imigrante ilegal.
Eu assumi cerca de R$2 mil desta conta, e a agência de turismo no Brasil
assumiu o resto. Além de cobrarem está fábula, mudaram os voos que estavam
originalmente marcados.
Depois de uma semana entre Miami e Orlando (substituindo as
Bahamas), nosso roteiro incluía Miami – Dallas. Por incrível que pareça, não
aconteceu nenhum problema com a American neste trecho. Ao chegar no aeroporto
de Dallas pegamos o ônibus para a central de locação de veículos. No trajeto o
ônibus quase bateu, e dois carros se arrebentaram na nossa frente. Chegando à
central fui até a Avis pegar um carro que eu já havia reservado e pago. Fiz o
processo no balcão, me deram um Chevrolet Impala, e saímos em direção à
garagem, carregados de malas, para localizar e pegar o carro. Bem quando
chegamos lá, um sujeito estava saindo com o Impala. Ali ao lado havia um balcão
da Avis, fui até lá e relatei o ocorrido. O atendente então perguntou: “o Sr. é
cliente preferencial da Avis?”. Resposta: “não”. “Então eu não posso atendê-lo
aqui, tem que voltar lá dentro na central de locação”. “Mas foram vocês que
fizeram a m.”, argumentei. Não teve jeito, tivemos que voltar com todas as
malas, e fazer tudo de novo. Ao final, apenas um cretino “I’m sorry”.
Passamos uma semana no Texas. Neste período o Texas sofreu
as maiores inundações da história, desde que começaram a ser registradas.
Estradas alagadas, alertas de tornado. Imaginem a situação, a gente dirigindo,
na estrada, e o celular (sim, nossos celulares) tocando sirene de perigo,
enquanto a programação do rádio era interrompida a cada intervalo de minutos,
para que alguém dissesse: “procure abrigo agora”. Procurar abrigo aonde, no
meio da estrada? Enfim, passamos nervosismo, tensão, stress, mas ao final da
semana conseguimos escapar sem sermos atingidos por tornados nem arrastados por
inundação. Dezenas de texanos não tiveram a mesma sorte neste período, e
pagaram com suas vidas.
A próxima etapa era Houston – Miami – Orlando. Chegamos à
área de embarque e vimos que o voo estava com 20 minutos de atraso, o que já
gerou um pouco de tensão, pois a conexão em Miami era apertada. Enfim,
embarcamos (dentro dos 20 minutos), o comandante pediu desculpas a todos, disse
que sabia das diversas conexões e prometeu recuperar no ar um pouco do atraso. E
nada. 30 minutos se passaram, e nada. Até que o comandante avisou que estava
aguardando o caminhão das refeições (refeições, na American, são uns sanduíches
horríveis, que eles vendem bem caro e quase ninguém compra). Enfim, cerca de 40
minutos depois começamos a taxiar e ... ficamos mais 45 minutos taxiando na
longa fila de aeronaves que pretendiam decolar.
Durante o voo as aerovelhas pediam desculpas e diziam que no
portão de desembarque haveria um agente da American para resolver os problemas
das conexões. Mentira.
Quando chegamos a Miami, o voo para Orlando já havia
partido. Procuramos o tal agente que estaria à disposição, e ele não existia.
Fomos encaminhados à central de remarcação de voos. Lá chegando, havia mais de
100 pessoas na fila, e apenas um funcionário da American para atender. Cada
atendimento levava cerca de 5 minutos, logo 100 X 5 = cerca de 500 minutos para
ser atendido. Atrás de nós, uma senhora de idade chorava compulsivamente, mas
ninguém se importava. Fui falar com uma funcionária American que estava ali
próxima, sem fazer nada, e disse que naquele ritmo o atendimento levaria horas,
e quando finalmente fossemos atendidos todos os voos do dia para Orlando já
teriam partido. Ela simplesmente riu da minha cara. Voltei para a fila,
continuei impaciente, a senhora chorando sem parar. Resolvi sair da fila e saí andando pelo
aeroporto, sem saber aonde ir, nem o que fazer. Lá pelas tantas resolvi
arriscar de novo e cheguei num balcão da American, expliquei a situação a um
funcionário, e ele resolver atender. Deu meia dúzia de tecladas no seu
computador e saímos dali com novos cartões de embarque para voo que partia em
40 minutos. Se era algo tão simples de resolver, porque subter os clientes
àquela tortura? Caminhamos em direção ao portão de embarque, enquanto os demais
infelizes permaneciam lá na fila das remarcações.
Nosso voo original de volta ao Brasil previa uma confortável
saída de Orlando hoje, sábado, às 16 horas, e voo noturno de Miami para São
Paulo. Mas, como disse lá em cima, além de cobrar multa absurda a American
mudou os voos, nos colocando num voo às 7:30 da manhã de hoje para Miami, e
outro as 9:46h para o Brasil. Acordamos à 4:00h da manhã. Em Orlando já informaram
que o voo estava com 20 minutos de atraso, o que novamente nos deixou tensos.
Mas, enfim, estávamos todos embarcados antes dos tais 20 minutos. O comandante
pediu desculpas, etc. e ... nada. Simplesmente não aconteceu nada, o avião não
saiu do lugar, e ninguém deu informação nenhuma. Uns 15 minutos depois da porta
do avião ter sido fechada, vimos pela janelinha a bagagem começando a chegar. Até
carregarem, mais atraso, e o avião finalmente saiu pouco depois das 8:30h.
Desembarcamos em Miami às 9:25h, nosso voo para o Brasil
saía 9:46h. Era apertado, tínhamos que percorrer 37 portões, mas começamos a
correr como loucos. Chegamos ao portão 50 às 9:35h, faltando portanto 11
minutos para o horário de decolagem. A atendente (mais uma feia a mal humorada
da American) informou que o voo já estava fechado e que deveríamos ir ao setor
de remarcação (aquele). Perdi minha paciência, gritei, xinguei, o avião ainda
estava ali, conectado ao finger e parado. Não adiantou. Dois ou três minutos
depois chegaram mais uns 30 ou 40 brasileiros que estavam na mesma situação.
Para não atrasar o voo 5 ou 10 minutos, deixaram 40 pessoas sem embarcar.
Fomos todos ao tal setor de remarcações, e as únicas opções
eram voos noturnos ou no dia seguinte. Nos colocaram num voo da Tam que parte
às 20h para São Paulo. Passaremos o dia inteiro no aeroporto. Disseram “I’m
sorry”, e deram 24 dólares para cada um se alimentar durante o dia.
Deixar 40 passageiros de voo internacional sem embarcar por
conta de 10 ou 15 minutos revela uma total falta de preparo e de gerenciamento
da companhia. Quando chegamos ao setor de remarcação de voo eles se deram conta
do absurdo e ligaram para uma central da American para tentar segurar o avião,
mas já era tarde. Além de fazer um avião voar semi vazio para o Brasil, a
empresa ainda tem custo com as refeições, com os hotéis e taxis daqueles que só
vão embarcar amanhã, e com outras companhias (a Tam não vai nos levar de
graça). É um festival de absurdos, de fazer inveja a um país cucaracha.
Escrevo esta história sentado aqui no aeroporto, esperando o
tempo passar. Quando conseguir um wifi, coloco no blog. Nesse meio tempo, tive
que interromper a redação para atender uma ligação. Era a empresa de segurança
no Brasil informando que o alarme do meu escritório disparou. Vou fazer o quê a
milhares de quilômetros?
E ainda não terminou...
Como não consegui um wifi, deu tempo para a história ter
mais desenvolvimentos.
Ficamos enrolando na ala de embarque/desembarque, pois não
adiantava sair de lá de manhã, pois a Tam não faria pela manhã check in para
voo das 20h. Enrolamos, almoçamos (para gastar os dólares da American), e nos
encaminhamos para o check in da Tam. O aeroporto de Miami é enorme, a Tam e
American ficam exatamente nos extremos opostos. Não é uma caminhada curta entre
uma e outra. Chegamos lá, ficamos na fila, e enfim chegou nossa vez de sermos
atendidos. A moça da Tam fez todo o procedimento de check in e, por fim, pediu
que colocássemos nossas malas na balança. Falei para ela que não estávamos com
as malas, que a American informou que as malas seriam automaticamente
transferidas para a Tam. A moça então informou que a política da companhia não
permite check in de passageiros sem as malas. Ou seja, sem malas não embarcamos
na Tam. Mandaram que nos virássemos com a American (nesta altura do campeonato
o comandante Rolim não se revira mais no seu túmulo porque também já perdeu
qualquer esperança em relação à empresa que fundou). Evidência de que a aliança
One World não passa de um factoide marqueteiro.
Lá fomos nós, de novo, rumo ao outro extremo do aeroporto.
Tivemos que localizar o customer service da American, esperar na fila, ser
atendido, relatar toda a sucessão de trapalhadas, ao que a atendente da
American, sempre com muita má vontade respondeu: “a Tam tem que aceitar, é a
regra”. E eu – “bem, mas eles não aceitam, o que quer que eu faça?”, a feia –
“também não tem nada que eu possa fazer, posso até mandar uma mensagem interna
para que tragam suas malas, mas não tem previsão de prazo para entrega, vai
demorar muitas horas”. E eu – “então fazemos o que, ficamos aqui nos EUA para
sempre, impedidos de viajar?”. Neste ponto ela nem respondeu, simplesmente deu
de ombros.
Milhares de imigrantes ilegais invadem os EUA todos os dias
(e são recebidos de braços abertos pelo governo Obama), mas naquele momento eu
estava no contrafluxo, daria qualquer coisa para sair dos EUA.
Para encerrar o assunto, fomos transferidos de volta para um
voo da American, desta vez um voo que sai para São Paulo às 22h. Neste momento
estamos aguardando embarque, que ocorrerá daqui ... 6 horas.
Nos EUA a gente não consegue andar um quilômetro sem cruzar
com a propaganda de um advogado, prometendo processar tudo e todos em seu nome.
Mas por incrível que pareça, dentro dos aeroportos não existe anúncio de nenhum
advogado. Inexplicável, pois ficariam milionários arrancando indenizações das
companhias aéreas.
Atualizando – como tentei acessar o blogger através de um
computador que não e o meu, e de fora do Brasil, o site interpretou como
tentativa de invasão e me bloqueou. Então este post só vai para o ar depois que
eu conseguir (se conseguir) voltar ao Brasil e desbloquear o blog...
Finalmente chegamos! Aleluia. O momento em que passei pela
porta do avião da American foi um momento de glória. Nunca mais estarei dentro
de um avião deles. Mas para fechar com chave de ouro ... as malas não vieram,
ficaram em Miami.