"O jogo normal de esquerda e direita, que permite a continuidade do processo democrático e mantém os extremismos sob rédea curta, foi substituído por um sistema de controle monopolístico não só do poder estatal como da cultura e da mentalidade pública; controle tão eficiente que já não é percebido como tal, de modo que, quanto mais patológica é a situação, mais confortavelmente todos se acomodam a ela, acreditando piamente viver na mais pura normalidade democrática.
A facção que domina o governo controla também o sistema de ensino, as universidades e instituições de cultura, o meio editorial e artístico e a quase totalidade dos órgãos de mídia. A mais mínima falha nesse controle, o mais leve sinal de descontentamento, mesmo parcial e apolítico, desperta ou alarma as hostes governistas, que se apressam a mobilizar seus militantes para o combate a "ameaças golpistas" inexistentes. A facção dominante compõe-se da aliança indissolúvel entre a esquerda e a extrema-esquerda, sendo esta última, então, legitimada como parte da esquerda normal, digna do respeito e da consideração dos eleitores.
Tão perfeito é o controle hegemônico que essa aliança exerce sobre a sociedade, que nem a esquerda nem a extrema-esquerda têm de se apresentar francamente como tais: os eleitores tornaram-se como peixes que, jamais tendo estado fora da água, ignoram a existência de algo que não seja água e portanto não distinguem entre a água e o universo em geral. Nessas condições, está realizado o ideal de Antônio Gramsci, em que o Partido revolucionário desfruta "da autoridade onipresente invisível de um imperativo categórico, de um mandamento divino".
Tão paradoxal é a situação, que os únicos que insistem em exibir sua identidade de esquerdistas, com orgulho disso, são justamente os membros da "oposição", colhidos entre facções da esquerda moderada ou entre oportunistas sem ideologia nenhuma. Uns e outros têm com o governo divergências pontuais e, é claro, disputa de cargos. Nada mais."
segunda-feira, 10 de outubro de 2011
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