Dias atrás vi reportagem no Bom Dia Brasil sobre famílias que passam fome no interior do Maranhão.
As imagens eram aquelas que já conhecemos, famílias paradas na porta de casebres de barro, num cenário de desolação.
Algumas mães eram entrevistadas: “não tenho comida para dar para meus sete bichinhos.” A expressão “bichinhos” era usada pelas mães para se referir às crianças.
Quando voltava para o estúdio o semblante dos apresentadores era fechado, tenso, deixando no ar que aquela situação era culpa de alguém, e que este alguém não fazia nada para resolver o problema. Quem era este “alguém”? Vista a carapuça quem quiser.
Os apresentadores de telejornais da Globo ganham dezenas de milhares de reais por mês, e, provavelmente, algumas horas depois, nem lembravam mais da reportagem. Voltarão a lembrar dela apenas quando forem receber os prêmios jornalísticos que geralmente são dados a reportagens sobre miséria.
Eu, por outro lado, fiquei com aquelas imagens na cabeça, e pensando – a culpa é de quem? Seria minha? Será que sou culpado por ter estudado, ralado, trabalhado e ter hoje uma renda (ameaçada pela crise) que me permite viver em condições melhores que as famílias do Maranhão? O semblante dos apresentadores do Bom Dia Brasil parecia me acusar desta culpa. A culpa da fome era dos que têm comida.
Em reportagens como esta uma coisa é comum: “meus sete bichinhos”, “meus dez bichinhos”, “meus doze bichinhos”.
Mas nunca a reportagem sequer indica que pelo menos parte da culpa é de quem, vivendo na miséria, faz dez “bichinhos”.
Parece que a culpa é sempre de alguém externo à situação, que teria a responsabilidade de oferecer condições decentes de vida a todos os “bichinhos” nascidos, não importa quantos sejam. Aos fazedores de “bichinhos” não é imputada responsabilidade alguma. São apenas vítimas.
Ao negar responsabilidade a quem deveria tê-la (pelo menos a de controlar seus instintos), estaremos condenados a conviver eternamente com reportagens como esta.
A diferença é que os apresentadores do Bom Dia Brasil tiram a maquiagem e já não lembram mais do assunto. Ou pior, esquecem do assunto e abrem o sorriso quando entra a reportagem sobre os campeonatos estaduais e a nova vitória do Corinthians. E depois ainda ganham prêmios jornalísticos com a miséria. Eu, que não ganho nada (nem salário no padrão deles), fico me remoendo com as imagens na cabeça.
E a situação permanece exatamente a mesma.
terça-feira, 3 de fevereiro de 2009
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